segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Mocajuba: migrantes

A ilusão do migrante, Drumond Andrade

Residência Ribeirnha na Ilha de Tauaré - Mocajuba
Foto: Carmen Américo

Quando vim da minha terra,se é que vim da minha terra



(não estou morto por lá?),

a correnteza do rio

me susurrou vagamente

que eu havia de quedar

lá donde me despedia.


Mocajuba - Foto Carmen Américo

Os morros, empalidecidos

no entrecerrar-se da tarde,

pareciam me dizer

que não se pode voltar,

porque tudo é conseqüência

de um certo nascer ali.


Panoramica do Rio Vizeu Mocajuba - Pa
Foto: Carmen Américo

Quando vim, se é que vim

de algum para outro lugar,

o mundo girava, alheio

à minha baça pessoa,

e no seu giro entrevi

que não se vai nem se volta
de sítio algum a nenhum.

 
Mocajuba, Praia dos Gorgons
Foto: Carmen Américo

Que carregamos as coisas,

moldura da nossa vida,

rígida cerca de arame,

na mais anônima célula,

e um chão, um riso, uma voz

ressoam incessantemente

em nossas fundas paredes.

Olha Dagua : Localidade Mocajubense
Foto: Carmem Américo

 
Novas coisas, sucedendo-se,

iludem a nossa fome

de primitivo alimento.

As descobertas são máscaras

do mais obscuro real,

essa ferida alastrada

na pele de nossas almas.





Estrada da Localidade de Carapajó-Cametá
Foto: Carmen Américo


Quando vim da minha terra,

não vim, perdi-me no espaço,

na ilusão de ter saído.

Ai de mim, nunca saí.

Lá estou eu, enterrado

por baixo de falas mansas,

por baixo de negras sombras,

por baixo de lavras de ouro,

por baixo de gerações,

por baixo, eu sei, de mim mesmo,

este vivente enganado,

enganoso.


Menino Amazônida / Mocajuba - Pará
Foto Carmen Américo


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